Arte? Blasfêmia! Blasfêmia? Arte!
24/09/14 08:08Bem-vindo a “uma verdadeira Babel de ódio a Deus”.
Virgem Maria ora é travesti, ora está coberta por baratas. Uma das salas se chama “Dios es maricas” (Deus é bicha). Visitantes são convidados a fazer “procissão” dentro de úteros gigantes, onde cortinas vermelhas delimitam “espaços para abortar”.
Daniel Martins, 28, está horrorizado. “É um acinte à religião, ao Deus nosso Senhor. Um guia convidou alunos a assinar uma petição pela abolição do inferno”, afirma à Folha o coordenador da ação jovem do IPCO (Instituto Plinio Corrêa de Oliveira).
O grupo traz no nome o fundador da TFP (Tradição, Família e Propriedade), organização católica conservadora que crê: “Depauperar a família destrói a civilização”.
Agora, querem fazer barulho. Um buzinaço, para ser mais preciso, contra a 31ª Bienal de São Paulo —anunciada oficialmente como a mostra da “transgressão, da transcendência e da “transexualidade”.
Segundo Martins, eles imprimiram 50 mil panfletos para denunciar “aborto, blasfêmia e sacrilégio” na exposição.
Elencam dez momentos que poderão ser vistos por “seu filho, sobrinho ou neto” em excursões de colégios —por isso, incentivam o envio de mensagens de protesto a diretores de escolas paulistanas.
O movimento sugere ainda pressionar o cardeal de São Paulo, Dom Odilo Scherer. Ele deveria se valer “de sua grande influência –que aliás corresponde a sua sagrada missão de pastor– para impedir que esses sacrilégios continuem a ser cometidos em sua jurisdição”.
A assessoria da Arquidiocese paulista diz que dom Odilo visitará em breve a Bienal e, aí, avaliará se cabe tomar alguma posição.
CRUZADA
Cerca de 40 voluntários vêm distribuindo o manifesto pela cidade. Nesta semana, estiveram em frente ao metrô Butantã e à PUC. A avenida Paulista é uma das próximas paradas. “Blasfêmia não é arte, não é ‘liberdade de expressão'”, diz o documento.
O IPCO também gravou um vídeo expondo a “ditadura feminista” do coletivo boliviano “Mujeres Creando”, responsável pela instalação pró-aborto. No material publicado na internet, vários “piiiis” substituem palavrões de mulheres injuriadas com a presença do grupo no pavilhão da Bienal.
A mentira tem oito pernas curtas para Martins. Na sua opinião, a exposição já mostrou a que veio ao eleger como símbolo desenho “de um hindu” (o indiano Prabhakar Pachpute): a torre de Babel movida por oito perninhas.
Para a equipe de curadores da Bienal, “a arte reflete sobre questões que afetam a vida das pessoas”.
“Falar de coisas complexas, invisíveis ou apagadas é fundamental. Acreditamos que o debate publico que esta surgindo é importante para tratar de assuntos tão delicados como o direito das mulheres de tomar decisões sobre os seus próprios corpos, a questão da liberdade sexual e o lugar e papel da religião e da fé na nossa sociedade.”